domingo, 10 de setembro de 2017

Jack e Margareth - Conto 4

Jack estava sentado na cadeira perto da cozinha, se é que aquilo poderia ser chamado de cozinha... a geladeira, que já nem funciona mais, estava cheia de livros velhos de Margareth. As prateleiras, por outro lado, cheias dos mais diversos utensílios, novíssimos e caros. Aposto que nenhum deles foi usado naquela casa e muito menos seriam utilizados. Mas graças a eles a cozinha ainda poderia ser chamada de cozinha.
Mas não pense que a casa toda é assim, Margareth tenta deixar o resto dos cômodos impecáveis, os quadros foram todos bem selecionados pelos seus olhos críticos, os papéis de parede também, nenhuma parede branca foi a única exigência de Jack. A casa tem dois andares, em cima temos o quarto de Jack, que esse sim é uma bagunça ordinária, e um outro quarto de visitas. Embaixo, uma sala pequena, uma cozinha e o misterioso quarto de Margareth. Esse mistério já rendeu uns bons poemas, Jack nunca entrou lá, ainda...
Bem, fiquem a vontade, li em algum lugar que ''o que faz o lugar ser bom são as pessoas'', acho que foi em um biscoito da sorte Chinês ou algo assim.
São exatamente 6 horas da manhã e Jack tenta terminar o seu texto. Margareth acabara de se arrumar, sua rotina na semana é sempre a mesma: acorda 5:00 da manhã, levanta-se e toma uma ducha, abre as cortinas, escolhe sua roupa e em seguida prepara um café bem forte. Algo que nunca falta naquela casa são os cigarros e whisky de Jack e o pó de café.
Margareth passa pela sala, nota que seu quadro preferido está um pouco torto, uma pintura formidável inspirada nas bailarinas azuis de Edgar Degas. Após arruma-lo vai para a cozinha e começa a fazer seu café.
Antes mesmo de Margareth dar bom-dia ela é cortada por Jack:
J: Ouça isso aqui, por favor. Senta aí.
M: Quem diria você precisando da minha ajuda.
J: Começa mais o menos assim: A língua passa pelo licor, entre as cerejas e o vinho...'', preciso de mais sabor... mais uma pitada de sabor?
M: Tente um pouco de vermelho agora, isso sim tem sabor.
J: Ok, ''E entre seus lábios a minha própria sina, em vermelho sangue''. O que acha?
M: Ao fim coloque algo fora de si...
J: Que tal ''Um êxtase sublime pelo corpo inteiro''
M: Está indo bem com esse poema, conseguiu dormir essa noite?
J: Espere, espere. Agora sim estou quase acabando.
M: Com esse cheiro de whisky que senti já pude me responder...
Margareth coloca uma xícara ao lado de Jack e enche de café. São agora 6:30 e ela não pode se atrasar para o trabalho. Todas as manhãs, das 7 horas até às 15:30 da tarde, Margareth se prende aos números, trabalha na consultoria de estatística mais importante da cidade. Ela bebe seu café e vai em direção a porta:
- Até mais tarde, Jack. Quando acabar o poema não esqueça de me mostrar.
- Espere!
Na hora que ela coloca o pé para fora de casa, Jack pucha seu braço e entrega o texto, pronto. Margareth traga cada palavra e da um sorriso. Isso é música para seus ouvidos. Quando ela olha de volta para dentro de casa, Jack já havia sumido, provavelmente para seu quarto no andar de cima. Se tem algo que realmente pode salvar alguém em uma manhã cinzenta são a palavras de Jack, escolhidas a dedo em busca de efervescência. Dessa vez seu poema estava embrulhado em um papel de carta, ''para Margareth'' escrito bem em cima.
 - ''Eu olharia nos seus olhos até que a eternidade nos devorasse''.
Ela lê em voz alta a última frase, olhando suavemente para a rua. Tranca a porta e sai em direção ao metrô com a carta em suas mãos.

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