•Margareth (entra em casa correndo e bem feliz, são 20:00 da noite e Jack está sentado na cozinha, olhando para o nada. Ela coloca uma caixa preta na mesa)
- Pronto, é isso!
•Jack (dando um gole em uma bebida forte)
- Você demorou hoje pra chegar do trabalho, foi sair com alguém é? Geralmente você costuma ser tão pontual.
•Margareth (ignorando)
- Comprei uma câmera! Estou com um novo projeto em mente, para nós dois, inclusive!
•Jack
-Da onde surgiu essa ideia? Quer virar fotógrafa?
•Margareth
- Estou querendo trabalhar menos na consultoria, acho que aqueles números todos e aquelas pessoas realmente não estão me fazendo muito bem.
•Jack
- Corta essa, acha que me engana? Tem algo aí, não é possível. Além disso, você foi feita para os números, não consigo nem pensar em outra profissão que você se encaixaria.
•Margareth
- Bom, eu até tentei Biologia. E, olha aqui, eu nem faço tanta questão assim desses números, voc~e exagera demais.
•Jack (ri sarcasticamente)
-Sim, claro, é verdade, sua obsessão é outra ilusão minha.
Agora me diz, ainda lembra algo de Biologia? Chegou mesmo a fazer curso?
•Margareth
- Sim, claro que cheguei a fazer, inclusive, tinha as melhores notas da sala.
•Jack
- Isso era de se esperar, as melhores notas. Conte-me um novidade.
•Margareth
- Eu ainda lembro bem de algumas coisas... você sabe sobre a taxa metabólica de um pinguim de 65kg?
•Jack
-Por que diabos eu saberia disso?
•Margareth (falando rápido e animada)
- Em valores médios, quando o pinguim está dormindo a taxa é 60kcal/h, porém quando a atividade dele deixa de ser tão leve, como a ação de andar, a taxa passa para 400kcal/h. Entretanto, quando a atividade passa a ser um pouco mais pesada, como corrida, a taxa chega a 800kcal/h! Agora, sobre cachorros, 3 cães de 25 quilos tem necessidades superiores à de um cão de 75kg, isso se dá pois, com a razão entre a área de superfície e o volume corporal diminui com o tamanho do animal, nos cães menores a soma de energia consumida pelos 3 vai ser sempre superior à do cão de maior porte. Bem, agora sobre as vacas...
•Jack (interrompe Margareth)
- Estupendo mesmo, me perdi quando você misturou pinguins com cachorros. Qual o motivo de ter largado o curso?
•Margareth
- Naquela época eu ainda era vegana. Quando a matéria chegou em botânica, comecei a saber exatamente tudo sobre as plantas, tudo. E bem, a ideia de que elas também sentissem dor, como os animais, começou a me dominar de vez... e o problema é que quanto mais eu estudava sobre elas, menor ficava meu cardápio... então já viu, precisei largar aquilo, não me fazia bem...
•Jack
-Margareth, você é uma pirada. O que é que não acaba por te fazer mal?
•Margareth (abre a caixa e tira uma câmera da caixa)
- Enfim, foco! Olhe só esta câmera!
•Jack
- Legal... e o que pensa em fazer com ela?
•Margareth
- Estou com um projeto novo para o meu site... nosso site. Quero abrir uma página basicamente para fotos documentais, estive lendo sobre essa tipologia e fiquei encantada! Preciso disso! Talvez com esse projeto eu consiga também me afastar tanto de números e mais números.
•Jack
- Te conheço bem, Margareth, não escolheu esse gênero fotográfico aleatoriamente. Acredito que essa é a que mais envolve delicadamente o controle... e, bem, você sabe que não são só números que te afligem mas o domínio também... novamente o controle.
•Margareth
- Jack, eu me informei bastante sobre esse assunto. Já até sei que devo utilizar o modo de prioridade de abertura, assim não precisarei ter que configurar sempre a câmera e...
•Jack ( sem deixar que ela termine)
- Parabéns, você sabe a parte técnica inteira, mas pense em uma cena de conflito, você pode até saber sobre a configuração mais perfeita, porém, surtaria com a falta de controle e caos do momento. Fotografia vai muito além de uma iluminação e posição perfeitos.
•Margareth (pensativa e um tanto quanto triste)
- Talvez você esteja certo mesmo.
•Jack (levanta da cadeira e ajuda a guardar a câmera de volta na caixa e a tampa)
- É uma pena ver o quanto sua personalidade anancástica acaba contigo, Margareth, estou falando sério contigo. Sua compulsão te devora cada vez mais e eu não posso fazer nada para parar isso, apenas você.
•Jack (enche seu copo de whisky até a boca e dá um gole que acaba com a bebida do copo)
- O seu projeto pode até ser interessante, mas convenhamos, eu te conheço, você não conseguiria nem por um dia aguentá-lo. Margareth, entenda, até que você não ache a porte de saída do seu labirinto numérico, não conseguirá suportar quase nada.
•Jack ( deixa o copo na mesa e vai em direção a Margareth e sussurra em seu ouvido antes de virar as costas e subir para o seu quarto)
- A ficha precisa cair. O tempo não para. Quanto mais você se perde nesse labirinto, mais seu suicídio é prolongado.
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