sexta-feira, 3 de janeiro de 2025

Brasília, 8 de dezembro de 2024 (modificado)

 Ia dormir, mas fui responder algumas mensagens e acabei retornando para a escrita. Preciso voltar a ser calma. Preciso não estar contaminada. Vi que escrevi em outro momento sobre poço de fazenda. Lembro-me de eu, criança, correndo sozinha na estrada de terra da fazenda com minhas botas bem gastas pelas aulas de montaria. Achei um poço no meio do milharal. Achei que tivesse descoberto um mundo de segredos. A água estava gelada. Bichinhos em cima da água se moviam, feito aranhas d'água. Parece que se chamam aquarius esses insetos de pernas finas. Eu lembro que bebi, enfiei meu rosto na água gelada, espantando os insetinhos. Não dava para ver o fundo, tudo era um tom de azul marinho. Sempre tive medo de abrir os olhos embaixo d'água. Sei que eu me aventurava sozinha por todo canto da fazenda do meu pai, algumas vezes sozinhas, outras vezes com as crianças do caseiro. Brincávamos de dar comida para os porcos, chupar cana, andar à cavalo e perseguir os girinos da nascente do Rio Verde. Em outros momentos, minha brincadeira era com meus amigos imaginários. Seus nomes, guardados no fundo da minha cabeça - eles possuem corpo, voz, sentimentos e partes de mim. Lembro-me bem deles, em memórias meio opacas, em brincadeiras que aconteciam no meu quintal de casa e também na porta de vidro da sala. Saudades. Vivo no passado pois moro numa casa de infância ainda. Ou, talvez, procuro ao máximo viver numa casa de infância para fingir que há como segurar o tempo nas mãos. E o pior, ainda não sou uma pessoa velha. Casa repleta de coisas, bagunça do que já fui e sou, paredes que me viram crescer. Escrevo aqui, agora, mas sinto que minhas memórias antigas - se posso dizer -, são todas tão classificáveis. Parece que posso contar. Consigo classificar coisas novas? Posso ver mais do que vivi? Esquecer e relembrar. Nem todo livro me dará respostas. Gostaria de procurar mais nas florestas do Norte, ao lado de lobos.