Enquanto antropóloga, sei, isso não é uma etnografia! Mas sinto a urgência de anotar, escrever, desembaraçar as mãos - ter um pouco do vivido e compartilhado em pauta, mesmo que seja análise ou conversa de saída na rua - conversa com alguém que está esperando, com você, ø sinal ficar vermelho para atravessar a rua.
Uma pausa, escovo os dentes. Quem sou eu? Lua. Digo em alto tom na minha cabeça, tentando cortar diálogos de Camila que não pode ouvir ou ver um fato que já quer transformar em ideia para um novo conto. Como posso explicar isso para você? É como se eu estivesse numa boa, lavando as mãos na pia do banheiro e vem esse diálogo puxando pra entrar numa urgência desesperada de transformar e criar um pensamento num grande texto em que Mário e Margarete (meus personagens comuns dos meus contos) estarão no fronte.
É tipo quando leio uma história de um livro e devaneio, começo a criar outra história dentro do livro.
Sinto que Camila tem essa urgência de querer escrever ø tempo inteiro. Ou melhor, de tentar transformar TUDO ø que pode em um conto com personagens. Transformando fatos diversos em diálogos e especificidades de cenários para contos.
Eu me seguro! Para quem me escuta pode ser algo como “eu tento segurar para que esses pensamentos não me tomem por inteira e eu passe a começar a rascunhar um texto legalzinho, um conto”. Eu entendo isso mas eu, que estou aqui, QUERO ESTAR AQUI, PRESENTE. Não quero outra na minha cabeça agora. Quero ter controle dos meus pensamentos. Que venha então Camila em outra hora e faça isso, mas não quando eu estou aqui e me sinto aqui. Eu ein. Se compartilho minha cabeça com outras, que essas esperem até eu estar saciada da minha própria realidade. Depois que eu já não estiver aqui, que tome minhas rédeas - ou melhor - as próprias, seja de quem virá, de quem terá sua vez. Um corpo é apenas um para tantas lógicas, nomes e cores, infelizmente. Mas assim que há de ser.